domingo, 26 de dezembro de 2010

Cidades

«Nada garante que Kublai Kan acredite em tudo o que diz Marco Polo ao descrever-lhe as cidades que visitou nas suas missões, mas a verdade é que o imperador dos tártaros continua a ouvir o jovem veneziano com maior atenção e curiosidade que a qualquer outro enviado seu ou explorador.»

Ciudad [...], Bett, Argentina

«E já o Grão Kan folheava no seu atlas os mapas das cidades que nos ameaçam nos pesadelos e nas maldições: Enoch, Babilónia, Yahoo, Butua, Brave, New World.
Diz: - Tudo é inútil, se o último local de desembarque tiver de ser a cidade infernal, e é lá no fundo que, numa espiral cada vez mais apertada, nos chupar a corrente.
E Polo: - O inferno dos vivos não é uma coisa que virá a existir; se houver um, é o que já está aqui, o inferno que habitamos todos os dias, que nós formamos ao estarmos juntos. Há dois modos para não o sofrermos. O primeiro torna-se fácil para muita gente: aceitar o inferno e fazer parte dele a ponto de já não o vermos. O segundo é arriscado e exige uma atenção e uma aprendizagem contínuas: tentar e saber reconhecer, no meio do inferno, quem e o que não é inferno, e fazê-lo viver, e dar-lhe lugar.»
As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino
______________
Ilustrações: Ciudad del Arco Iris, Ciudad de los Vientos, Ciudad en las Nubes, Ciudad de las flores, Ciudad de la Música e Ciudades Eclipsadas.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Feliz Natal!

Greeting card, Laura Iorio, Itália

«- Sinto-me tão leve como uma pena, feliz como um anjo, alegre como um estudante em férias, aturdido como um homem ébrio. Feliz Natal para todos e Próspero Ano Novo! Olé! Olá! Olé!»
[...]
Um rapazinho endomingado passou por baixo da janela.
- Ó homenzinho, que dia é este?
- Hein? - disse a criança espantada.
- Que dia é hoje, meu rapaz?
- Hoje? Ora!, é dia de Natal!
"Dia de Natal!", disse para consigo Scrooge, "vamos, não o perdi; os Espíritos fizeram tudo numa noite; podem fazer tudo o que quiserem; certamente que podem!"»
«Canção de Natal», in Contos de Natal, de Charles Dickens

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Prendas de Natal

The Gift Machine, Robert Dunn, Reino Unido

«Mas quem está a bater à porta? Como aquele grupo ruidoso para lá corre e arrasta a jovem!... Ela ri por aparecer assim despenteada àquele que entra: é o pai dos gaiatos turbulentos que reconheceram a sua voz, e vem acompanhado por um homem carregado de presentes de Natal. Oh!, quem salvará o transportador de todos esses presentes? Que assalto à sua pessoa! Um trepa por ele com a ajuda de uma cadeira, outro revista-lhe os bolsos; é a ver quem apanhará os embrulhos. Felizmente, em breve cada um tem o seu e o transportador pode esquivar-se.»
«Canção de Natal», in Contos de Natal, de Charles Dickens

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Inverno


The Growth - [...], Alessandra Fusi, Itália

«Vivi em constante Inverno,
sem uma ponta de Sol,
e em gélida escuridão
percorri ruelas de solidão.

Numa manhã ao acordar,
deparei-me com a Primavera,
e uma ponta de Sol rejuvenesceu o meu jardim,
que tinha sido queimado com a geada,
com a mesma intensidade, com que eu nunca fui amada.

No momento em que o Verão bateu-me à porta,
acabaram-se-me os desamores,
porque trouxera o brilho dos teus olhos azuis,
e o Sol que prometera bronzear todos os amores.

Mas a ilusão foi companheira do Outono,
e na minha vida surgiram sem demora
e sem ambiente calmo,
lágrimas escorreram pela minha face,
como folhas desavindas, ao caírem de uma árvore.»

As minhas quatro Estações, Carla Costeira

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Cinco anos a pintar em...

ilustração: phermad

O tonsdeazul hoje está de parabéns. Tem uma mão cheia de anos!

Este ano já pintei mais do que nos anos anteriores. Deve ser um sinal de que irei continuar por aqui por mais uns tempos. ^.^
Como o ano está a chegar ao fim, vou aproveitar, mais uma vez, o aniversário do tonsdeazul para vos falar de pequenos momentos que marcaram o ano de 2010.

Deixei de conhecer virtualmente a minha amiga Teté. Agora conheço-a mesmo em pessoa. A oportunidade surgiu e pronto, conheci uma mulher fantástica, que é tudo aquilo que mostra ser no seu
blogue e muito mais. Para ti, muitos beijinhos. ^.^

Vi menos cinema este ano, mas registo três filmes que valeram realmente todos os minutos.

Toy Story 3 de Lee Unkrich. Fiquei rendida a estes personagens. Agora tenho mesmo de ver os dois anteriores, porque confesso que apesar de adorar filmes de animação, estes nunca me tinham convencido.
O Segredo de Seus Olhos de Juan José Campanella. Tinha votado no francês, Um Profeta de Jacques Audiard, como melhor filme estrangeiro, mas depois de ver este argentino mudei claramente de ideias. Simplesmente brilhante! Daqueles filmes que nos deixam sem palavras. Depois de sairmos da sala de cinema, ficamos longos minutos a digerir todas as emoções e pensamentos.
O Amor é Melhor a Dois de Dominique Farrugia e Arnaud Lemort. Uma excelente comédia romântica, que tive a oportunidade de assistir na 11ª Festa do Cinema Francês. Cada pessoa tem a sua forma de sonhar com o encontro perfeito, com o momento em que vai encontrar a tal pessoa… Maravilhoso!

Concertos
foram alguns, mas destaco dois como os que tocaram cá dentro. O terceiro dia do Alive, com
Pearl Jam e o concerto de Rodrigo Leão & Cinema Ensemble.
Uma música que marcou o meu Verão e fará parte dos meus dias azuis: Estrela do Mar de Jorge Palma.

Quanto a teatro aconselho mesmo a peça O Senhor Puntila e o Seu Criado Matti de Bertolt Brecht, que ainda está em cena até 30 de Janeiro de 2011. É divinal! O Miguel Guilherme é do melhor, não retirando mérito aos outros actores. Os cenários estão muito bons e a composição musical ajuda abrilhantar o que já está brilhante.

Finalmente chego aos livros. 102 livros lidos este ano. 47 lusófonos e 55 estrangeiros. Tal como o ano passado, não foi fácil fazer uma selecção. Daí optei por dividi-los em categorias.
Literatura Lusófona:
- O ano da morte de Ricardo Reis de José Saramago
- o remorso de baltazar serapião de valter hugo mãe
- A Capital de Eça de Queirós
- Livro de José Luís Peixoto
- O Evangelho do Enforcado de David Soares

- As mais belas coisas do mundo de Valter Hugo Mãe (livro infantil)
Não menos importantes, refiro ainda: O Dia dos Prodígios de Lídia Jorge, O Alienista de Machado de Assis, As Aventuras de João Sem Medo de José Gomes Ferreira, Parábola do Cágado Velho de Pepetela, Os Livros Que Devoraram o Meu Pai de Afonso Cruz, O Sétimo Véu de Rosa Lobato de Faria e O Fio das Missangas de Mia Couto.
Literatura Estrangeira:
- Crime e Castigo de Fiódor Dostoievski
- A Quinta dos Animais de George Orwell
- O Deus das Moscas de William Golding
- Os Irmãos Tanner de Robert Walser
- A Papisa Joana de Donna Woolfolk Cross
Também não menos importantes: Desgraça de J. M. Coetzee, A Mancha Humana de Philip Roth, O Monte dos Vendavais de Emily Brontë, Siddhartha de Hermann Hesse, O Físico de Noah Gordon, Revolutionary Road de Richard Yates e Os Filhos da Meia-Noite de Salman Rushdie.
Poesia:
- Eneida de Virgílio
- a verdade dói e pode estar errada de João Negreiros

- Quando fui outro de Fernando Pessoa (Antologia da autoria de Luiz Ruffato)
- Há Prendisajens com o Xão de Ondjaki
- Raiz de Orvalho e Outros Poemas de Mia Couto
Não este ano não me esqueci da poesia, Nelson! ^.^
Para trás ficaram muitos outros, mas destes 102 não houve assim nenhum mau ou algum que tivesse sido colocado de lado. Houve sim algumas histórias que me souberam a pouco, mas apenas por esperar um pouco mais do que aquilo que encontrei.

Termino com beijinhos e abraços.
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Adenda: Havia dois prémios azulados a entregar. Estes não foram mencionados aqui ontem, porque a tons de azul considera que ao mencioná-los retirava toda a espontaneidade a quem por aqui passasse. Assim agradeço a todos os que visitam o tonsdeazul e a todos os que pincelaram. Hoje informo que os dois felizes contemplados foram o Menphis e a N. Martins. Parabéns e aguardo um contacto vosso para poder enviar os prémios. ^.^

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Sonhos de Natal

Estrellas, Poly Bernatene, Argentina

«Scrooge voltou para a cama e retornou o curso das suas reflexões. Quanto mais pensava, mais se sentia embaraçado, e quanto mais embaraçado ficava, mais pensava ainda. O espectro Marley perturbava-o extraordinariamente. "Era apenas um sonho?... Oh!, sim, era um sonho!..." E, no entanto, bem podia repetir estas palavras que o problema continuava a apresentar-se-lhe ao espírito sempre na mesma e sempre insolúvel.
Scrooge permaneceu neste estado até o relógio dar os três quartos de hora, e então tornou a lembrar-se de que o espectro o havia avisado de uma visita ao bater da uma hora. Resolveu esperar, acordado, que a hora chegasse: que poderia fazer de melhor, considerando que lhe era impossível adormecer de novo?»
«Canção de Natal», in Contos de Natal, de Charles Dickens

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

"quais são para ti as coisas mais belas do mundo?"

«O meu avô sempre me dizia que a melhor parte da vida haveria de ser ainda um mistério e que o importante era viver procurando.
Eu sei hoje que ele queria dizer que a cada um de nós cabe fazer um esforço para ser melhor, fazer melhor, cuidar melhor de nós próprios e dos outros. A cada um cabe a obrigação de cuidar do mundo, porque o mundo é um condomínio enorme onde todos temos casa.
O meu avô queria dizer que não devemos ficar parados à espera de que algo aconteça. A magia de estarmos vivos vem da possibilidade de fazermos acontecer.»

É assim que começa a história infantil As mais belas coisas do mundo, de Valter Hugo Mãe. Uma história que nos vem (re)lembrar o sabor das melhores coisas da vida.
Através de um jogo de perguntas e respostas, um menino é desafiado pelo seu avô a conhecer os mistérios da vida. O avô inventa um sem fim de enigmas, de modo a colocar o menino a pensar, a pesquisar e a procurar as soluções, que muitas vezes lhe levavam «a um doce, a um brinquedo, a um livro ou a um novo jogo.»
Nem sempre o menino conseguia descobrir a resposta, mas o avô esclarecia sempre as suas dúvidas e apesar de por vezes ficar frustrado, o menino sabia que «aprender [era] algo de progressivo.»
Até que um dia o avô lhe perguntou quais eram as coisas mais belas do mundo e ele não soube o que dizer...

Valter Hugo Mãe revela-nos uma outra vertente de contar histórias e também aqui nos consegue deliciar e conquistar. Neste livro para crianças e não só, as maiúsculas também têm direito a brincar com as minúsculas.
Um livro doce e maravilhoso, com ilustrações de Paulo Sérgio BEJu, para ler e reler e não deixar esquecer o que realmente importa.

domingo, 12 de dezembro de 2010

"o coração dela bateu depressa,...

L'albero dei cuori, Michela Galassi, Itália

... sentiu-o no pescoço, custou-lhe respirar"

«Se namorares comigo, dou-te um pombo, cem escudos e um livro.
Ilídio. Ela temia o que desejava. Tentou distinguir um cheiro por baixo do suor que repassava o papel. O amor, ela sempre sonhara com essa palavra, essa ideia. Agora podia começar a vivê-la. Escondeu o papel no louceiro.»
Livro, de José Luís Peixoto

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Músicas de Natal

Pelo City, A. Magaldi, Espanha

«E o nevoeiro sempre a aumentar, e o frio a tornar-se cada vez mais vivo, cada vez mais áspero e penetrante. Se o bom São Dunstan, patrono dos ferreiros, tivesse apertado o nariz do diabo com um frio tão mordente, em vez de servir-se do seu elemento familiar, o diabo gritaria com certeza a sério. O proprietário de um jovem nariz pontiagudo deteve-se a tremer em frente da porta de Scrooge para o regalar com uma balada de Natal mas, logo ao primeiro verso da introdução:

Deus o abençoe, alegre cavalheiro!

Scrooge pegou na régua que estava em cima da carteira com um gesto tão enérgico que o cantor semicongelado deitou a fugir aterrorizado, abandonando o buraco da fechadura ao nevoeiro e ao frio.»
«Canção de Natal», in Contos de Natal, de Charles Dickens

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Cheiro a Natal

Esquimau, Jeremy Moncheaux, França

«Mas estou certo de ter, pelo menos, encarado sempre o Natal, de cada vez que ele apareceu, e à parte o respeito devido ao seu nome sagrado e à sua santa origem, se é que se podem separar estas coisas do Natal, sim, sempre encarei o Natal como um tempo feliz, um tempo de bem-querença, de perdão, de caridade, de boas relações; a única época que eu saiba em que, no longo calendário do ano, homens e mulheres parecem, num consentimento unânime, abrir os corações e pensar na pobre gente que lhes fica por baixo, como companheiros de viagem desta vida para outra, o que são de facto, e não como uma outra raça de criaturas visando um objectivo diverso. Deste modo, tio, embora o Natal nunca me tenha metido uma moeda de oiro ou de prata no bolso, creio que o Natal me fez bem e me fará bem. [...]
- Se ouço sair mais uma palavra da sua boca - disse-lhe Scrooge -, festejará o Natal com a perda do emprego.»
«Canção de Natal», in Contos de Natal, de Charles Dickens

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

"Bem-vindo ao grande mundo"



«A minha perplexidade aumentou durante a viagem de táxi até à cidade. Não sei exactamente o que esperava de Istambul - nada, talvez, já que tivera tão pouco tempo para antecipar a viagem -, mas a beleza da cidade tirou-me a respiração. Tinha um carácter de Mil e Uma Noites que nem todos aqueles carros a buzinar ou os homens de negócios com fatos ocidentais conseguiam anular. A primeira cidade, Constantinopla, capital de Bizâncio e primeira capital de Roma cristã, deve ter sido inacreditavelmente deslumbrante, pensei - um casamento entre a riqueza de Roma e o misticismo do cristianismo primitivo. Quando encontrámos quartos no velho bairro de Sultanahmet, já tinha sido atingido por visões fugazes e estonteantes de dezenas de mesquitas e minaretes, de bazares exibindo tecidos finos, e até um lampejo de Hagia Sophia, com as suas muitas cúpulas e quatro chifres enfunando-se acima da península.»
O Historiador, de Elizabeth Kostova

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

"os homens nunca se contentam"

Ando sempre à procura de descobrir novos autores. Não novos autores de serem novos na arte de escrever, mas sim novos para mim, que nunca lhes desvendei as suas formas de contar estórias! E este ano então a maioria das minhas leituras têm sido uma descoberta!

As Aventuras de João Sem Medo, de José Gomes Ferreira foi a última descoberta lida. Esta obra é uma aventura pegada e como a Isabel Maia bem referiu faz lembrar, sem dúvida, as aventuras mirabolantes de Alice no País das Maravilhas, de Carroll, As Viagens de Gulliver, de Swift e eu ainda acrescento que também me fez viajar até à trilogia Os Nossos Antepassados, de Calvino.

Pois como não poderia deixar de ser, João Sem Medo é o personagem principal destas aventuras. Tudo começa quando João Sem Medo cansado de viver em Chora-Que-Logo-Bebes, que era uma aldeia onde os infelizes choraquelogobebenses não faziam mais nada do que choramingar de manhã à noite, decide saltar o Muro. Este tinha sido «construído em redor da Floresta Branca onde os homens, perdidos dos enigmas da infância, haviam estalado uma espécie de Parque de Reserva de Entes Fantásticos.» Nunca nenhum choraquelogobebense ousou saltá-lo e João Sem Medo estava a querer quebrar todas as regras, levando a sua mãe ao desespero, que berrava histericamente por não mais voltar a ver o seu rico filhinho.

E assim que João Sem Medo salta o Muro entra num mundo mágico e dá início a hilariantes e inacreditáveis aventuras, que acabam por desmistificar as histórias de Príncipes e Princesas, Dragões e Gigantes, Fadas e Bruxas Más. Sim as histórias das Fadas e das Princesas são aqui achincalhadas por João Sem Medo. Este não se deixa facilmente intimidar pelas forças enigmáticas e malévolas da Floresta Branca e com o seu ar trocista brinca ironicamente, com o “nosso” imaginário infantil. Acredito que o autor pretendia espicaçar-nos, para que não deixemos morrer a criança que existe em nós.

Para iniciar esta caminhada, João Sem Medo teve de escolher entre dois caminhos: o asfaltado ou o de pedregulhos. O bom caminho conduzia à felicidade, mas para isso João Sem Medo tinha que deixar de pensar:
«-Ninguém pode seguir o caminho asfaltado que leva à Felicidade Completa sem se sujeitar a este programa bem óbvio. Primeiro: consentir que lhe cortem a cabeça para não pensar, não ter opinião nem criar piolhos ou ideias perigosas.»
Ora claro está que João Sem Medo optou pelo caminho árduo! Ou não se chamaria João Sem Medo! E é nesta irreverência de ousar saltar o muro e de querer pensar por si próprio, bem como em outras partes da história que encontramos subtilmente a outra mensagem que este livro também pretendia passar. O que à primeira vista não deixa de ser um livro para crianças, é também ele uma mensagem irónica ao Portugal fascista, que vivia alienado e fechado sobre si mesmo e atrasado em relação ao Mundo.

Tudo é tão absurdo e tão bem conseguido fantasticamente por José Gomes Ferreira, que fiquei maravilhada com a sua capacidade efabulatória. Somos completamente transportados para estas aventuras onde habitam gramofones com asas, homens pássaros, meninas de pés ocos, que são feitas de fruta, pedras que têm bocas e tantas outras personagens. E somos também levados a viajar para terras onde todos diziam o mesmo, para outras onde tudo era às avessas, percorremos o deserto onde vimos o nosso herói a sacrificar-se todo para se alimentar, fomos parar à terra do príncipe de orelhas de burro, que se achava o homem mais bonito e a tantos outros lugares inimagináveis.

E assim, com este romance mágico, José Gomes Ferreira faz crescer em nós o João Sem Medo, aquele que salta o Muro e não tem medo de nada, porque carrega em si todos os sonhos do mundo, como o Poeta.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

"voo solitário"

Little Red Plane, de Karin Taylor, Austrália

«Ergueu os olhos para as estrelas, que luziam por cima da rota estreita, quase apagadas pelos letreiros luminosos, e pensou: «Esta noite, com os meus dois correios em voo, sou responsável por um céu inteiro. Esta estrela é um sinal que me procura nesta multidão e que me encontra: é por isso que me sinto um pouco estrangeiro, um pouco solitário.»
Voo Nocturno, de Antoine Saint-Exupéry

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Banco de Livros arranca hoje

Grimm Press, Marina Marcolin, Itália

«“A acção do Banco de Livros é um decalque do Banco Alimentar, mas em que o bem oferecido é um livro”, explicou a directora de Marketing das Livrarias Bertrand, Teresa Figueiredo, referindo-se a uma iniciativa que irá decorrer durante a época pré-natalícia, de forma a garantir que os livros doados são entregues às crianças mais desfavorecidas na época do Natal.

As Livrarias Bertrand prepararam um conjunto de livros que são recomendados e que “estão a preços muitos acessíveis”, assim como vales de dois euros que poderão ser adquiridos e depois doados.»

A iniciativa Banco de Livros é inédita em Portugal e irá decorrer até 5 de Dezembro, em todas as livrarias do grupo.
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sábado, 13 de novembro de 2010

«O Senhor Puntila e o Seu Criado Matti»

A peça O Senhor Puntila e o Seu Criado Matti, de Bertolt Brecht «é uma das comédias mais brilhantes deste dramaturgo». Estreou no passado mês de Outubro e estará em cena até dia 30 de Janeiro de 2011, na Sala Azul do Teatro Aberto, em Lisboa. Com encenação de João Lourenço, esta é composta por um elenco de 15 actores e três músicos, sendo que os principais papeis estão a cargo de Miguel Guilherme (senhor Puntila) e Sérgio Praia (criado Matti). A composição musical apresentada na peça foi criada pelo artista Mazgani e será interpretada ao vivo pelo elenco.

«Excepcional apreciador da bebida, Puntila sofre de dupla personalidade: quando está sóbrio é arrogante e egocêntrico, quando está ébrio é fraternal e compassivo. Oscilando entre ambos os extremos, ele surpreende e confunde tudo e todos, amigos, subordinados e desconhecidos.

Esculpida como uma parábola, contendo a riqueza de reflexões maiores sobre o poder, a justiça, a igualdade entre os homens e a dependência, mas também o louvor aos prazeres da vida e à natureza, esta peça encerra um potencial de consciencialização individual e social e uma actualidade histórica que será estimulante descobrir.»

Em palco de Quarta a Sábado às 21h30 e Domingo às 16h00.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

"dois nomes e duas identidades"

As Fogueiras da Inquisição, de Ana Cristina Silva deixaram-me com a curiosidade de ler algo mais sobre a personagem histórica Grácia Nasi ou Beatriz de Luna, seu nome cristão.
O blogue Destante e a editora a esfera dos livros proporcionaram-me esta oportunidade, uma vez que fui a feliz contemplada do concurso que oferecia um exemplar do livro Grácia Nasi, de Esther Mucznik.

Nesta obra, Esther Mucznik fala-nos da vida de Grácia Nasi, a judia portuguesa que nasceu e viveu no século XVI; uma época trágica para os sefarditas e cristãos-novos. Estes viviam num clima de medo e insegurança, que os obrigava a fugir de um país para o outro, de modo a evitar a fogueira. Como eram constantemente perseguidos pela Inquisição ficavam impedidos de praticar livremente a sua fé, tendo que a esconder no seio das suas famílias e das suas casas.

Grácia Nasi nasceu em Lisboa no ano de 1510. Como a sua família foi obrigada a converter-se, Grácia Nasi foi baptizada de Beatriz de Luna. «Cristã por fora, judia de alma», Grácia Nasi «aprende a ser fiel à religião antiga» e mantém o desejo de encontrar a tranquilidade para assim poder professar a sua fé às claras. Em 1528 casa-se com Francisco Mendes, mas vê cedo o seu marido partir. Viúva aos vinte e seis anos, Beatriz de Luna é obrigada «a assumir a gestão da imensa fortuna familiar, tendo à partida uma dupla dificuldade: era mulher e cristã-nova.» Contudo, é esta fortuna que lhe salva e lhe permite ultrapassar diversas situações adversas.

«Não sabemos como era Grácia Nasi. Mas podemos imaginá-la de cabelo escuro, elegante, um pouco austera, de porte altivo e ricamente vestida, como convinha a uma mulher poderosa e afortunada. Uma mulher de olhar firme e decidido, um pouco místico também, como o rosto marcado pelo peso da responsabilidade de administrar um império e de chefiar uma família, numa das épocas mais conturbadas da história judaica.»

Com a morte de Francisco Mendes, Grácia Nasi tem de fugir de Portugal devido às constantes pressões, tanto da Igreja, como do Rei, que lhe cobiçavam a fortuna. Desta forma, empreende uma viagem pela Europa até alcançar o Império Otomano. Pelo caminho, estabelece-se em Antuérpia, Veneza, Ferrara e entre outros lugares onde continua a desenvolver «os negócios familiares baseados no comércio da pimenta e especiarias, mas também do açúcar, vinhos […], pérolas, gemas e pedras preciosas.» e a ajudar principalmente os judeus sujeitos às perseguições. Foi essa compaixão e solidariedade para com «os seus irmãos de infortúnio» que «teceram o outro fio condutor da sua vida.»

Nesta biografia, Esther Mucznik presta homenagem a uma «mulher que ousou desafiar o destino a que a sua condição de mulher e cristã-nova a condenava.»

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

«Poema da despedida»

Entangled, Robert Dunn, Reino Unido

«Não saberei nunca
dizer adeus

Afinal,
só os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo»
in Raiz de Orvalho e Outros Poemas, de Mia Couto

terça-feira, 2 de novembro de 2010

A Mesquita Azul

Mesquita Azul e Mesquita Sofia, Istambul

A Praça de Sultan Ahmet é o coração da parte antiga de Istambul. É no bairro de Sultanahmet que nos deparamos com os lugares de maior interesse e entre eles encontra-se a Mesquita Azul (Sultanahmet Camii). Esta é das mesquitas mais bonitas que visitei ou não fosse ela azul! E é conhecida por Mesquita Azul basicamente devido à sua cor azul e verde, que predomina nas paredes e cúpulas.

A Mesquita de Sultan Ahmet é a única mesquita com seis minaretes em toda a cidade e na Turquia. Daí ter surgido uma lenda em volta dos minaretes.
Conta-se que o Sultão Ahmet I pediu ao arquitecto, Mehmet Aga, um minarete de ouro. Só que a forma de pronunciar "ouro" é muito idêntica à de "seis". Assim, dizem que o arquitecto fingiu não perceber e construiu seis minaretes em vez de um em ouro, pois este era bem mais caro.
_________________
Fonte: Istambul - Berço de Civilizações, MERT Basim Yayincilik Dağitim ve Reklamcilik Tic. Ltd Şti.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

a Biblioteca

La Cité des Livres, François Schuiten, Bélgica

«Chegada a noite, volto a casa e entro no meu escritório; e, na porta, dispo a roupa quotidiana, cheia de lama e de lodo, e visto trajes reais e solenes; e, vestido assim decentemente, entro nas antigas cortes dos homens antigos, onde, recebido amavelmente por eles, me alimento da comida que é só minha, e para a qual nasci; onde eu não me envergonho de falar com eles e de perguntar-lhes as razões das suas acções. E eles com a sua bondade respondem-me; e, durante quatro horas, não sinto tédio nenhum, esqueço-me de toda a ansiedade, não temo a pobreza, nem a morte me assusta: transfiro para eles todo o meu ser.»
Carta a Francesco Vettori, de Maquiavel

domingo, 24 de outubro de 2010

momentos do lado do sentir


Depois de ter aguardado a sua última obra com grande ansiedade, de só ter sido possível adquiri-la um dia depois do lançamento e de a ter lido sofregamente, só podia aguardar alegremente pelo dia da sua chegada aos algarves para o autógrafo e para mais um momento de troca de dois dedos de conversa.
Como sempre José Luís Peixoto não desiludiu. Recebeu os seus leitores com um largo sorriso e manteve com eles uma calorosa e animada conversa. Gostei imenso dos nossos 5 minutos, onde lhe pude transmitir o quanto tinha gostado deste Livro e mostrar-lhe as passagens que mais me tinham marcado, maravilhado e surpreendido.
É sempre muito bom poder haver esta ligação entre o autor e o leitor!

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

21º Amadora BD: Passa a Palavra


A cidade da Amadora recebe, de 22 de Outubro a 7 de Novembro, a 21.ª edição do Festival Internacional de Banda Desenhada. O principal ponto de encontro será, novamente, no Forum Luís de Camões, na Brandoa.

O Centenário da República é o tema de destaque deste ano. Assim, é de realçar as seguintes mostras: «A I República na Génese da Banda Desenhada e no Olhar do Século XXI; Schuiten e Peeters; Centenário de Fernando Bento; e uma mostra de Richard Câmara, autor do desenho original dos diversos materiais gráficos e autor português em destaque.»

Mais uma vez, o Festival prima pela descentralização e haverá exposições noutros pontos da cidade, tais como: Galeria Municipal Artur Bual, Casa Roque Gameiro, Recreios da Amadora e Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem. E este ano também irão estar na Kidzania/Centro Comercial Dolce Vita Tejo.

Programação em: http://www.amadorabd.com/

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Trilho de São Lourenço

Percurso: Pedestre
Localização: Quinta do Lago, Almancil, concelho de Loulé
Distância aproximada: 3-4 km (ida e volta)
Duração aproximada: 1h30
Grau de dificuldade: Baixo

O percurso, que está integrado no Parque Natural da Ria Formosa, tem início e término na Ponte de Ancão, Quinta do Lago. Do lado da ria é possível observar o extenso cordão dunar, a laguna e o sapal. Do outro lado encontram-se os campos de golfe e o pinhal.

Neste trilho de terra batida e sem declives encontram-se dois observatórios de aves. O primeiro junto à ria e o segundo situa-se no lago artificial do campo de golfe de São Lourenço. Através destes pontos, os adeptos desta actividade podem observar uma grande variedade de aves aquáticas, tais como o Camão (Porphyrio porphyrio), a Garça-pequena (Ixobrychus minutus), o Galeirão (Fulica atra), o Mergulhão-pequeno (Tachybaptus ruficollis) e entres outras. A Pega-azul (Cyanopica cyanus) e o Camaleão (Chamaeleo chamaeleon) também têm por hábito assinalar a sua presença nos Pinheiros-Mansos e nos Pinheiros-Bravos.

Ao longo do percurso deparamo-nos com diferentes tipos de vegetação, como
o Saganho-Mouro (Cistus salvifolius), a Aroeira (Schinus terebinthifolius), o Tojo-do-Sul (Genista hirsuta algarbiensis), o Junco (Juncus effusus), a Esteva (Cistus ladanifer) e muitas outras.

Ao chegarmos às ruínas romanas é hora de fazer o percurso inverso e regressar ao ponto inicial. Neste ponto volta-se a ter contacto com a ria e com as suas aves, como as Limícolas e os Flamingos.

Pinturas populares (últimos 30 dias)