segunda-feira, 29 de março de 2021

"Todas as pessoas são alguém"


Almoço de Domingo, de José Luís Peixoto, narra um acontecimento futuro, vivido no presente e que agora é passado. A vida de Rui Nabeiro é contada em três dias, de sexta a domingo, nos dias 26, 27 e 28 de março de 2021. Começa dois dias antes do almoço de domingo, antes do grande dia em que o senhor Rui fará (fez) 90 anos. 

José Luís Peixoto conseguiu neste romance autobiográfico fazer algo magistral. Romancear uma vida de 90 anos em três dias. Em três dias Futuros, que foram sentidos no Presente e que agora são o Passado do senhor Rui, mas também o meu Passado.

Nestes três dias decorre o passado de um homem marcante, que marcou e continua a marcar uma cidade, uma região, um país. Um homem simples que tem mundo dentro, mas os seus, as suas gentes e as suas raízes são o seu Alentejo, o seu Campo Maior.

90 anos contados em 3 dias. 90 anos anos percorridos através das memórias de um homem. De um menino que cedo cresceu homem. De um homem que guarda as mortes dos seus, ainda muito jovem, mas também muitas vidas e um "amor profundo e ancestral de uma família reunida no seu almoço de domingo." De um homem que tem dentro de si as várias gerações, os pais, os irmãos, o tio, os filhos, os netos, os bisnetos e a sua Alice. De um homem que não gosta de café com leite, mas sim de café. De um homem que trabalhou até nos dias em que os seus dois filhos nasceram. De um homem que consegue que a sua marca marque muitas famílias. De um homem que nasceu em 1931 e por isso as suas memórias são também as memórias de um país. A ditadura, o tempo em que "o contrabando é resistência perante a pobreza", a inauguração de uma ponte, o 25 de abril, a descolonização, a guerra civil no país vizinho e tantas outras memórias. Pois afinal são 90 anos e não 3 dias.

28 de março de 2021. O dia em que o senhor Rui fez 90 anos e agradeceu em direto, a quem esteve a ouvir falar sobre "o trabalho de um homem que fez muito, mas porque os outros fizeram bastante".

Obrigada senhor Rui por uma vida tão inspiradora. Obrigada José Luís Peixoto por esta obra tão genuína. Obrigada por esta vida tão cheia, agora também ela fazer parte das minhas memórias. 

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