Tinha lido boas opiniões e comecei a leitura de O Físico, de Noah Gordon com as expectativas muito em alta e no final não me senti ludibriada com este primeiro livro de uma trilogia.
Rob Jeremy Cole ao tocar nas mãos de sua mãe soube que esta iria morrer. Quando o pai adoeceu, Rob evitava tocar-lhe nas mãos, mas quando um dia as tocou soube que restavam ao pai poucos dias de vida. Aos nove anos, Rob fica órfão e vê os seus irmãos, um a um, a serem entregues a diferentes famílias de acolhimento, até ao dia em que também ele consegue alguém para cuidar dele, Croft, o barbeiro-cirurgião. É como aprendiz do Barbeiro, que Rob deixa a cidade de Londres do século XI.
Numa carroça carregada, o Barbeiro e Rob deambulam de terra em terra divertindo com malabarismos, histórias e cenários de magia e vendendo aos seus pacientes o milagroso Específico Universal. Nesta época a bruxaria não era vista com bons olhos, nem tão pouco os físicos, os cirurgiões e os barbeiros, pois só a Trindade e os santos tinham o verdadeiro poder para curar. Eles evitavam confusões, pois temiam que os seus receituários pudessem ser considerados actos de bruxaria. Com o passar dos anos, Rob foi adquirindo mais experiência como aprendiz de barbeiro-cirurgião e ao chegar a cada localidade já tinha os seus próprios doentes, até ao dia em que o Barbeiro morre e Rob volta a estar sozinho.
O destino volta a colocar-lhe no destino o judeu Benjamin Merlin, que ele tinha conhecido em Tettenhall e que muito o tinha intrigado por este físico conseguir operar um cego de modo a devolver-lhe a visão. Fica então a saber que o físico Merlin tinha estudado na Pérsia, com o melhor físico do mundo, Abu Ali at-Husain ibn Abdullah ibn Sina. Rob estava disposto a tornar-se físico, pois sabia que tinha um dom, mas Merlin era judeu e não poderia ensinar a sua arte a um cristão. Determinado a saber mais que um simples barbeiro-cirurgião, Rob empreende uma longa jornada a caminho da Pérsia. Integra uma caravana, onde faz amizade com três judeus que lhe ensinam o persa e com quem aprende os seus hábitos. É também nesta longa viagem que fica a conhecer Mary Cullen, por quem se apaixona, mas que deixa para trás por a sua vontade em ser físico ser muito maior. Na última cidade cristã, Rob J. Cole deixa para trás a sua religião (mas não renuncia ao seu Deus) e o seu nome e parte para Ispahan como judeu. É como Jesse ben Benjamin que se apresenta na madrassa para iniciar a sua formação, mas é recusado e preso. No entanto, é-lhe concedido um calaat pelo Xá Alã e recebe um convite para se inscrever na madrassa e estudar medicina no maristan.
Ao longo dos seus estudos, é enviado para o meio da peste, reencontra Mary Cullen, vai para a guerra com o Xá Alã e nela perde o seu melhor amigo, Mirdin. Numa terra cheia de contradições, de radicalismos religiosos, de superstições e de violência Rob passa por imensas privações no seu longo empreendimento para alcançar o tão desejado conhecimento, para ser Hakim. Já como físico, regressa à sua cidade natal e aqui no Ocidente depara-se ainda com mais desconhecimento e ignorância do que no Oriente, mas «[o] outro sentido, a sensibilidade daquele que cura, nunca o abandonara. Quer o chamassem sozinho de noite para a beira de uma cama, quer se apressasse de manhã para o dispensário cheio de gente, sentia sempre a dor deles. Apressando-se a lutar contra ela, ele nunca deixou de sentir, tal como sentira desde o primeiro dia no maristan, um acesso de gratidão surpreendente por ter sido escolhido, por ter sido para ele que a mão de Deus se estendera e nela que tocara, e que tal oportunidade de guiar e de servir tivessem sido dadas ao aprendiz do Barbeiro.»
Uma extraordinária viagem pela Idade Média, que nos faz questionar o quanto a sociedade continua ignorante nos seus preconceitos e na sua intolerância religiosa. E que a medicina é mais do que um negócio, é antes uma vocação!