Quanto mais leio Isabel Allende, mais me apaixono pela sua escrita, pelas suas histórias e pelos seus personagens tão bem caracterizados.
A Casa dos Espíritos narra a saga da família Trueba. A história é passada no Chile, desde a década de 20 aos anos 70, e é tão intensa e envolvente, que o leitor sente-se completamente embrenhado nesta dinastia.
Esteban Trueba é o patriarca teimoso, colérico e de feitio não muito afetuoso, que levou a vida a pulso. Tudo o que conseguiu foi com o suor da sua luta e trabalho. Ergueu Las Tres Marias, a terra da sua família, fez fortuna e ganhou estatuto social. Já cansado de semear bastardos pela região, decide casar com Clara, a irmã mais nova de Rosa, a noiva falecida. Clara é fantasista e tem poderes sobrenaturais. Da união de ambos nascem Blanca, Nicolau e Jaime. Blanca apaixona-se por Pedro Tercero Garcia desde a infância e desta paixão nasce Alba, a neta por quem o senador Trueba mostra todo o seu afeto.
O relato da vida de Esteban Trueba, um homem carregado de defeitos e virtudes, e da sua família, que se estende por três gerações, está povoado de personagens dotadas de forças e temperamentos extraordinários, que não se perdem mesmo depois de mortos. A positividade está nas mulheres desta família. Elas são a força, a energia e a fuga para o que é mágico. Através desta narrativa, repleta de um realismo fantástico, vamos também tomando conhecimento da evolução social do país. Das atrocidades vividas pelo povo chileno no regime de Pinochet. Da luta pela liberdade de um povo e de um país, que podia muito bem ser qualquer país latino-americano. Da escuridão e da esperança que nos chega pela voz de Alba.
«Quero pensar que o meu ofício é a vida e que a minha missão não é prolongar o ódio, mas apenas encher estas páginas enquanto espero o regresso de Miguel, enquanto enterro o meu avô que descansa agora a meu lado neste quarto, enquanto aguardo que cheguem tempos melhores, gerando a criança que trago no ventre, filha de tantas violações ou talvez filha de Miguel, mas sobretudo minha filha.»
Isabel Allende neste seu primeiro romance, cheio de vida própria, narra com mestria uma formidável saga familiar onde os personagens ficcionais caminham lado a lado com os reais. Mesmo que nunca mencionados, sabemos que o poeta Pablo Neruda e o presidente Salvador Allende fazem parte desta história magistral.
Não há como negar, a literatura latino-americana é sublime.