terça-feira, 28 de julho de 2009

Gôndolas e gondoleiros

Gondoleiro de Veneza
Não fazia propriamente parte do itinerário, mas a simpatia de “Giácomo” foi o pretexto para aceitarmos o convite e embarcarmos na gôndola que nos levaria a desfrutar dos imensos canais de Veneza numa outra perspectiva.
Já de partida em direcção ao Grande Canal, Giácomo confidencia-nos que é gondoleiro, pois o seu pai e o seu avô também o são. E porque já os seus antepassados o eram. Pertence a uma das famílias antigas de Veneza e sente orgulho em ser gondoleiro.
O percurso escolhido avista-se bastante estreito e àquela hora o tráfego de gôndolas é constante, o que obriga a algumas manobras esforçadas. Um pé aqui nesta parede, outro acolá naquela e pronto podemos continuar.
Giácomo sorri e, enquanto se baixa para passar por mais uma ponte, vai assobiando melodias. Entre uma música e outra, Giácomo conta-nos histórias da sua Veneza, que nós agora, aqui escrevemos.
Há uns séculos atrás, as gôndolas apenas transportavam a realeza e as famílias nobres de Veneza. Estas eram pintadas de verde, azul e amarelo. De vermelho, de roxo e laranja. De castanho ou de rosa, se assim fosse a vontade do gondoleiro. Havia gôndolas de todas as cores!
Mas um dia a cidade foi invadida pela peste e esta levou com ela milhares de venezianos. Após aquele ano fatídico, os gondoleiros assinalaram o seu luto pintando as suas gôndolas de negro.

Gôndolas de Veneza
Paradas no Grande Canal, as gôndolas espreitam os turistas e aguardam mais uma viagem.

terça-feira, 21 de julho de 2009

"Fahrenheit 451 -

- a temperatura a que um livro se inflama e consome..."

«- Não é apenas a morte dessa mulher - continuou Montag. - A noite passada, pensei em toda a gasolina que tenho espalhado, há dez anos para cá. E pensei nos livros. E, pela prmeira vez, notei que, atrás de cada um desses livros, estava um homem. Um homem que os tinha concebido. Um homem que tinha passado o seu tempo a escrevê-los. E, até agora, nunca essa ideia me tinha aparecido. - Saiu da cama. - Algumas vezes, é necessária toda uma vida a um homem para pôr as suas ideias por escrito, olhar o mundo e a vida à sua volta; e eu chego e bum! Em dois minutos tudo se acaba.»
«A fornalha e a salamandra», in Fahrenheit 451, de Ray Bradbury

terça-feira, 7 de julho de 2009

"Ele foi Mattia Pascal"

«Uma das poucas coisas, aliás, talvez a única que eu tinha a certeza de saber, era esta: chamava-me Mattia Pascal. E aproveitava-me disso. De todas as vezes que algum dos meus amigos ou conhecidos demonstrava ter perdido o juízo até ao ponto vir visitar-me para obter algum conselho ou sugestão, eu encolhia os ombros, semicerrava os olhos e respondia-lhe:
- Eu chamo-me Mattia Pascal.»


Ele foi Mattia Pascal, de Luigi PirandelloAssim começa a história Ele foi Mattia Pascal, de Luigi Pirandello.
Nada sabia sobre a história. Nem nada sabia sobre o autor. E foi assim sem expectativas que iniciei a leitura deste extraordinário romance de Pirandello.

Mattia Pascal era um bibliotecário que levava uma vida igual à de todos os dias. Era casado, mas o seu casamento já não fazia sentido algum. Tinha de partilhar a casa com a sua sogra que lhe infernizava todo o santo dia. E como se isso não fosse já mais do que suficiente ainda era perseguido pelos credores.
Um dia cansado de tudo e de todos, decide viajar até Monte Carlo. Com ele leva apenas alguns trocos no bolso, que aproveita para jogar na roleta do casino. Nada lhe dizia que iria sair de lá rico, mas saiu.
Alguns dias depois apanha o comboio de regresso a casa, mas algo insólito acontece. Mattia Pascal lê num jornal a notícia da sua morte. E em questão de segundos, ele imagina-se livre e ainda por cima rico. O corpo erradamente identificado que continuasse a ser Mattia Pascal, porque ele agora teria uma nova vida e uma nova identidade. Seria Adriano Meis. Um homem pronto para viver finalmente a sua vida de sonho.

Mas estaria o homem que foi Mattia Pascal pronto para deixar de o ser?
Surgem então os problemas de Adriano Meis. Este não consegue ser Adriano Meis, porque, nos seus pensamentos, vive em conflito com o Mattia Pascal que foi. A liberdade que supunha que iria ter afinal prende-o e sufoca-o. Não é livre, nem tem identidade. É apenas uma sombra daquilo que foi e um dia a questão da morte assombra-lhe o pensamento. Pois se Mattia Pascal não morreu verdadeiramente, então ainda lhe faltava morrer! Como pôde Mattia Pascal acreditar que Adriano Meis teria a eternidade toda pela frente? Ah pois é! Seria altura de voltar a ser Mattia Pascal? De regressar à sua cidade natal e voltar para a sua vida monótona?

Leiam e desfrutem deste estonteante romance escrito em 1904, porque nada mais vos conto. Fiquei fascinada com a escrita de Pirandello. Simples, com humor e irónica. No final desta leitura, é impossível não ficarmos com os pensamentos aos saltos.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Memórias de uma procura

Memórias de uma procurailustração: phermad

Procura algo na imensidão da noite.
Algo que dê novo alento à sua vida
Monótona, triste e desinteressante.
Não encontra.
Presa nas suas memórias,
Percorre os flashes de outros tempos passados.
Onde, entre abraços e beijos,
O seu mundo era outro.
Mais feliz e sem sombras.
Sombras,
Que assolam agora o seu caminho.
O seu mundo parece fechar-se cada vez mais.
À medida que as horas vão correndo sem destino,
Dá consigo num quarto vazio.
Olha as suas paredes nuas
E nos seus reflexos encontra a imagem
De um ser perdido,
Sem lugar para onde ir,
Por não querer fugir.
Os pensamentos vão passando,
Sem vontade de parar.
Os minutos vão virando horas,
No enorme relógio de parede.
O dia que era hoje, já não é.
Assim como o mundo que outrora lhe fazia feliz,
Lhe aprisiona agora, entre paredes,
De solidão e tristeza.
Um quarto sem janelas,
Onde dia após dia, se encerra
Viajando pelas sombras das suas memórias.

Pinturas populares (últimos 30 dias)