Seis meses depois dou por terminado o desafio lançado em fevereiro. Na altura, referi que seria um desafio para dois meses. Pois… Estava ligeiramente enganada. Charles Dickens não é para se ler às pressas! A obra David Copperfield exige ser lida serenamente. É um livro denso e intenso, que nos encaminha para muitos lugares envolventes e emotivos da cidade londrina e arredores, na época vitoriana.
«Sabia que em meu coração, como em todos os corações verdadeiramente bons e elevados, a aflição dá força e não fraqueza. Da mesma maneira que os sofrimentos da minha infância tinham contribuído para fazer de mim o que eu era; da mesma maneira maiores desgraças, depurando-me o ânimo, melhor me tornariam ainda, para que eu pudesse transmitir aos outros, em meus escritos, o ensinamento que de mim próprio recebera.»
Em David Copperfield é ele quem nos conta a sua história, desde o seu nascimento até à idade adulta, em que vive os seus anos de pleno sucesso e felicidade. Nasce órfão de pai e ainda de tenra idade vê-se sujeito a uma educação rígida e traumática, por a sua mãe contrair casamento com Mister Murdstone, um homem austero e odioso. Após várias privações dolorosas e de ficar orfão de mãe, decide pedir dinheiro emprestado à sua querida ama, a boa Peggotty, e ir procurar a sua tia, Miss Betsy, em Douvres. A partir daqui a sua vida dá uma enorme reviravolta em todos os sentidos. E não vou prolongar-me em mais descrições sobre a história, pois todas as vivências de Copperfield estão descritas em 829 páginas, tão minuciosas e sentimentais, que só lidas terão o seu encanto.
Refiro antes que as obras de Charles Dickens estão sempre cheias de personagens, e esta não é exceção! Dickens é mestre na criação de personagens e a dar-lhes vidas e personalidades tão ricas, que é impossível, ao fim de tantas e tantas páginas, esquecê-las. Consegue-se criar ódio ao miserável Mr. Murdstone e à sua monstruosa irmã. Sentir repugnância pelo tão humilde Mr. Uriah Heep, que não passa de um homem pérfido. Sentir simpatia pela enorme família de Mister Micawber, tão infortunada nas suas aventuras. E afeição pelo empenho e dedicação de Traddles, o grande amigo e advogado de Copperfield. Não esquecendo a admiração por Mister Peggotty, o marinheiro que ruma para outros mares com a sua frágil sobrinha, Emília. Ou de sentir benevolência por Dora, a mulher-criança de Copperfield, que o deixa tão jovem. E até de compreender a resignação silenciosa da doce Inês.
Acrescento ainda que esta narração, por vezes, tende a parecer exageradamente sentimentalista. E é de facto! Pois, mesmo havendo momentos menos felizes na vida de David Copperfield, o amor, a bondade e a esperança estão sempre presentes, fazendo desta obra um verdadeiro clássico da literatura.
David Copperfield não é só uma autobiografia de Charles Dickens, é “talvez, o melhor romance para travar conhecimento com Dickens” (Jorge Luis Borges).
7 comentários:
Tenho muita vontade de ler esse do Dickens. A tua opinião veio aguçar a vontade. :)
Talvez o leia em inglês...
N. Martins só tens a ganhar se leres na versão original.
Não referi aqui, mas esta versão que li não foi realmente das melhores... Ainda para mais Dickens é daqueles escritores especiais e há poucas traduções boas de "David Copperfield", por isso perde-se muito da essência da obra.
A "Relógio de Água" agora tem uma nova edição da obra, que eu compraria se não tivesse já esta... E ainda por cima tem uma capa lindíssima! ;)
Isso é que foi uma maratona!
David Coperfield é uma obra que quero ler, mas não para ainda. Daqui a uns anos mais.
Tenho tido más experiências quando leio uma primeira Grande obra dos Grandes autores. Assim foi com Tolstoi, assim foi com Jane Austen.
Quero ler os livros menos conhecidos, ou menos espessos desses autores primeiro. Ler Anna Karenina foi uma lição para mim...
demorei 2 anos a lê-lo, pelo que durante 1 ano deixei o livro dado por "morto". Depois decidi que não era capaz de fazer isso e sempre - a custo - terminei-o.
Mas falando de Dickens, quero ler primeiro "O Cantico de Natal" (acho que é eset o título). Espero lê-lo pelas alturas natalícias. Outra tara minha! Li "O natal de Poirot" de Agatha Christie; "Um natal que nao esquecemos", de Mitchard, assim nessas alturas.
Gostei da tua opinião sobre este livro Enorme da Literatura :)
Li há muitos anos, aproveitando a "boleia" de uma série que dava na TV. Claro que não me lembro de todo o enredo, mas só dos traços principais. E do execrável Uriah Heep, que por acaso também era uma banda de rock de que gostava muito na época... :)
Beijocas e continuação de boas leituras! :D
Foi mesmo, Miguel Pestana!
Pois eu já conhecia o autor de outras leituras. O meu primeiro foi mesmo "Contos de Natal", cujo o livro pertence à minha mãe. Cheguei a falar dele aqui http://tonsdeazul.blogspot.pt/2007/12/contos-de-natal-de-charles-dickens.html
Este lido na época festiva do Natal tem, sem dúvida, outro encanto. Foi um livro que me marcou bastante.
Ler obras pequenas dos autores consagrados antes de passar à obra magistral é uma boa opção, que costumo seguir.
"Anna Karenina" é um marco de Tolstoi, mas ainda me falta o "Guerra e Paz". ;)
Boas leituras!
Uriah Heep é realmente um personagem marcante, Teté! Acho que não vou esquecê-lo tão cedo...
Nunca ouvi falar dessa banda de rock. Tenho de ir investigar. :)
Beijinhos
Ai que também quero ler :)
Mas isto é mais um desafio realmente.
:P
Tens razão, não é fácil Dickens nem os chamados "calhamaços"...Que deixam de o ser, logo que começamos a ler.
E a verdade é que nos deixam uma sensação de companhia maravilhosa! Aquelas personagens são eternas, amigos da vida. Os Peggotty, Dora, enfim!
Boa escolha!
A mim aconteceu-me ler em 2 anos um livro que adorei: "Feira das Vaidades"!
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