Em abril do ano passado visitei A Casa, em Lanzarote. Na altura, partilhei que o momento tinha sido vivido com todas as emoções à flor da pele. Mas a paisagem vulcânica daquela ilha também não dá para esquecer. Ainda hoje sinto aquele vento em mim.Foi após essa visita tão única, que fez-me todo o sentido iniciar os seis Cadernos de Lanzarote, escritos entre os anos de 1993 e 1998.
"Gente maliciosa vê-lo-á como um exercício de narcisismo a frio, e não serei eu quem vá negar a parte de verdade que haja no sumário juízo, [...].", assim refere o autor no seu primeiro caderno. No entanto, termina esta mesma nota introdutória tranquilizando os leitores "este Narciso que hoje se contempla na água desfará amanhã com a sua própria mão a imagem que o contempla."
Fui lendo-os bem devagar e conforme a vontade. Pois os diários não pedem pressa. Um ano depois termino o Último caderno de Lanzarote já com saudade no peito.
Nos cadernos há encontros, seminários e colóquios. Há viagens, apresentações, sessões de autógrafos e inaugurações. Há entrevistas. Há troca de correspondência entre os leitores e o autor. Há abraços, conversas de corredor e admiradores que o interpelam emocionados. Há dissabores. Há pensamentos e confidências. Há dias felizes e emotivos. Há dias tristes e lágrimas. Há homenagens. Há dias vazios. Há uma preocupação e um olhar sempre atento e crítico. Há questionamento e inquietação.
Aí reside toda a beleza destas memórias que culminam com o último diário do ano do Nobel, que tinha ficado perdido num disco rígido de um dos seus computadores.
"Este Sexto Caderno aparecerá em breve", deixou dito José Saramago (palavras de Pilar). Que feliz dia. 20 anos depois, este último caderno chegou aos seus leitores!
"Bem vistas as coisas, sou só a memória que tenho, e essa é a única história que quero contar."