quarta-feira, 31 de julho de 2024

"É preciso saber sair dos sítios no momento oportuno"

 


Tinha as expectativas em alta, porque Pátria foi um dos meus melhores livros do ano passado. Há dias terminei o Regresso dos Andorinhões de Fernando Aramburu e senti que fui atropelada e sobrevivi. Só que deixei de ser a mesma, após chegar até às entranhas de Toni.

Começamos em Agosto com Toni, o personagem deste livro, a informar-nos que não vai durar muito. Um ano. Foi o limite que colocou a si próprio. Aos 54 anos, prevê suicidar-se daqui a um ano e até diz-nos a data exata: 31 de julho, quarta-feira, à noite. 

"É o prazo que concedo a mim mesmo para pôr os meus assuntos em ordem e averiguar porque é que não quero continuar na vida."

Toni não gosta da vida e eu, nos primeiros meses, não consegui simpatizar com Toni. Pois o personagem, a par de ir libertando-se de objetos, decide também escrever notas retrospetivas de toda a sua vida ao longo desse ano que lhe resta. E no decorrer desses dias e meses fui dissecando Toni através das suas impressões. Daí que dei por mim a detestar e até sentir repulsa por este homem comum, professor de Filosofia, que tem um discurso, tantas vezes, repugnante para com as mulheres, e até de ódio para com os que lhe são mais próximos.

Só que à medida que os dias e meses vão avançando na história, a minha raiva apazigua-se e dou por mim enredada num turbilhão de outros sentimentos. 

A honestidade e a transparência das suas reflexões, com os seus altos e baixos, colocam a nu até os flashes da sua vida mais íntima. Toni desarma.

Questiono, questiono, questiono, ... 

Toni partilha o balanço da sua vida, com data de validade, em 802 páginas.

Poxa o quão a vida pode ser frágil e a solidão ruidosa!

"Há muito tempo que não me ria tanto. Não me ocorria outra forma de ocultar a tristeza que me embriagava."

Sim, porque... "É do caraças; se fores um homem, obrigam-te a morrer como um cão; se fores um cão, facilitam-te uma morte indolor, fazendo o mais possível para que estejas tranquilo e não te sintas só."

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