sexta-feira, 24 de novembro de 2023

A essência dos Cadernos de Lanzarote


Em abril do ano passado visitei A Casa, em Lanzarote. Na altura, partilhei que o momento tinha sido vivido com todas as emoções à flor da pele. Mas a paisagem vulcânica daquela ilha também não dá para esquecer. Ainda hoje sinto aquele vento em mim.

Foi após essa visita tão única, que fez-me todo o sentido iniciar os seis Cadernos de Lanzarote, escritos entre os anos de 1993 e 1998.

"Gente maliciosa vê-lo-á como um exercício de narcisismo a frio, e não serei eu quem vá negar a parte de verdade que haja no sumário juízo, [...].", assim refere o autor no seu primeiro caderno. No entanto, termina esta mesma nota introdutória tranquilizando os leitores "este Narciso que hoje se contempla na água desfará amanhã com a sua própria mão a imagem que o contempla."

Fui lendo-os bem devagar e conforme a vontade. Pois os diários não pedem pressa. Um ano depois termino o Último caderno de Lanzarote já com saudade no peito.

Nos cadernos há encontros, seminários e colóquios. Há viagens, apresentações, sessões de autógrafos e inaugurações. Há entrevistas. Há troca de correspondência entre os leitores e o autor. Há abraços, conversas de corredor e admiradores que o interpelam emocionados. Há dissabores. Há pensamentos e confidências. Há dias felizes e emotivos. Há dias tristes e lágrimas. Há homenagens. Há dias vazios. Há uma preocupação e um olhar sempre atento e crítico. Há questionamento e inquietação.

E toda a essência dos cadernos está nessas entrelinhas do homem e na humanidade desse homem: Saramago.

Aí reside toda a beleza destas memórias que culminam com o último diário do ano do Nobel, que tinha ficado perdido num disco rígido de um dos seus computadores.

"Este Sexto Caderno aparecerá em breve", deixou dito José Saramago (palavras de Pilar). Que feliz dia. 20 anos depois, este último caderno chegou aos seus leitores!

"Bem vistas as coisas, sou só a memória que tenho, e essa é a única história que quero contar."

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Trilho "Colla de Caballo"


Percurso: Pedestre 
Localização: Parque Nacional de Ordesa y Monte Perdido, Espanha
Distância aproximada: 17,5 km 
Duração aproximada: 5-6 horas (ida e volta)
Grau de dificuldade: Moderado 

O trilho "Cola de Caballo" tem início no Vale de Ordesa e é um dos mais bonitos e também o mais popular do Parque Nacional de Ordesa y Monte Perdido.

Na época baixa é possível levar o carro até esse ponto. Já no verão o carro tem de ficar na zona do Centro de Visitantes em Torla e daí seguir-se de autocarro. É aconselhável adquirir os bilhetes cedo ou no dia anterior para evitar o tempo de demora nas filas.

O percurso até à cascata Cola de Caballo tem 17,5 km, é linear, de dificuldade média e com uma duração de 5-6h. Como faz parte da GR-11, também está sinalizado com as marcas vermelhas e brancas.

Começamos então a avançar pela margem do rio Arazas, depois embrenhamo-nos pelo bosque até à primeira cascata do trajeto, a de Arripas. E ao longo do percurso vamos encontrando muitas outras que convidam a ficar e a contemplar.

A trilha é adequada para famílias, sendo que com miúdos pequenos faz-se ao sabor da vontade.

Foi o nosso primeiro trilho nos Pirineus Aragoneses e ficámos rendidos à paisagem.

E enquanto selecionava as fotos, pus-me a imaginar o quanto deve ser maravilhoso percorrer, nesta altura do ano, a parte do Faial com as suas cores outonais.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

"a esperança simplesmente é imortal"

 

"Setenta pessoas juntas que formam uma família, a caminhar para o final do seu tempo."

Misericórdia de Lídia Jorge. Por várias vezes hesitei este livro. Primeiro porque conheço a escrita de Lídia Jorge, que por vezes não é fácil, e segundo por saber que era um livro que abordava a finitude da vida. Ainda a viver o luto do meu pai, receei o embate. Tocou-me profundamente. Entranhou-se em mim.

Baseado nas vivências e pensamentos do último ano de vida da mãe da autora, este é um livro com vida dentro! Porque a morte é apenas um instante. Com ele pude revisitar as memórias dos meus mortos e enfrentar os meus fantasmas através das palavras de Maria Alberta, a quem tratavam por Alberti. Uma senhora cheia de fulgor e "strong".

Recordei os dias em que pisava a grande sala do Lar e o olhar do meu avô todo ele se iluminava. Pegava nas mãos dele e ali sentados ficávamos a falar da eternidade do tempo que nos fugia. E quando me ia, ouvia as suas companheiras de residência a mexericar: "O Sr. Serafim tem muita sorte. A neta está cá todos os sábados!" Naquela altura era uma jovem e não questionava o porquê de pouco me cruzar com outras visitas.

Nessa altura, não era tão duro encarar essa finitude, como o foi há um ano quando o meu pai me deixou. Há um ano quando saí do quarto dos meus pais sabia que o meu pai nos iria deixar nessa noite. Fugi da morte dele. Achava que se me fosse embora ele não morreria. Quando o telefone tocou eu sabia o que o meu irmão tinha para me dizer.

Misericórdia conduz-nos a uma reflexão sobre a vulnerabilidade da vida quando se caminha para o último fôlego. Mas nesta finitude não há somente espera. Há vida carregada de medos e anseios, mas também de curiosidade, sonhos e esperança. Há amizades, batalhas, zangas, amores e derrotas. Há saudade. Há uma enorme ânsia de alimentar os sentidos, num espaço e tempo limitado.

Um livro genuinamente belo, pois "a esperança simplesmente é imortal."

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Seguir sem ti...


Há um tempo e um espaço que continha a tua presença, pai, e depois há a dimensão da tua ausência.

🤍 12 meses
#sobreaperda #luto #vidaemorte

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