quinta-feira, 27 de outubro de 2011

escapando a tentações

Alfarrabista em Doolin, Irlanda

«Foi logo na montra da livraria que descobriste a capa com o título que procuravas. Atrás desta pista visual, lá foste abrindo caminho pela loja dentro através da barreira cerrada dos Livros Que Não Leste, que de cenho franzido te olhavam das mesas e das estantes procurando intimidar-te. Mas tu sabes que não te deves deixar assustar, que no meio deles se estendem por hectares e hectares os Livros Que Podes Passar Sem Ler. […] Com um movimento rápido passas por cima deles e vais parar ao meio das falanges dos Livros Que Tens Intenção De Ler Mas Antes Deverias Ler Outros, dos Livros Demasiado Caros Que Podes Esperar Comprar Quando Forem Vendidos Em Saldo, dos Livros Idem Idem, Aspas Aspas Quando Forem Reeditados Em Formato De Bolso, dos Livros Que Podes Pedir A Alguém Que Te Empreste e dos Livros Que Todos Leram E Portanto É Quase Como Se Também Os Tivesses Lido. Escapando a estes assaltos, avanças para diante das torres do reduto, onde te opõem resistência 
os Livros Que Há Muito Tempo Programaste Ler, 
os Livros Que Há Anos Procuravas Sem Os Encontrares, 
os Livros Que Tratam de Alguma Coisa De Que Te Ocupas Neste Momento, 
os Livros Que Queres Ter Para Estarem À Mão Em Qualquer Circunstância, 
os Livros Que Poderias Pôr De Lado Para Leres Se Calhar Este Verão, 
os Livros Que Te Falam Para Pores Ao Lado de Outros Livros Na Tua Estante, 
os Livros Que Te Inspiram Uma Curiosidade Repentina, Frenética E Não Claramente Justificada. 
E lá conseguiste reduzir o número ilimitado das forças em campo a um conjunto sem dúvida ainda muito grande mais já calculável num número finito, mesmo que este relativo alívio seja atacado pelas emboscadas dos Livros Lidos Há Tanto Tempo Que Já Seria Altura de Voltar A Lê-los e dos Livros Que Dizes Sempre Que Leste E Seria Altura De Te Decidires a Lê-los Mesmo. 
Libertas-te com uns ziguezagues rápidos e penetras de um salto na cidadela das Novidades Cujo Autor ou Assunto Te Atrai. 
[…] percorridos rapidamente com o olhar os títulos dos volumes expostos na livraria, dirigiste os teus passos para uma pilha [do livro que tanto procuravas], pegaste num exemplar e levaste-o à caixa para se regularizar o teu direito de propriedade sobre ele. 
Deste ainda uma espreitadela desnorteada aos livros em redor (ou melhor: foram os livros que te olharam com o ar desnorteado dos cães que das grades do canil municipal vêem um ex-companheiro afastar-se pela trela do dono que veio recuperá-lo), e saíste.» 
Se Numa Noite de Inverno Um Viajante, Italo Calvino

4 comentários:

Teté disse...

E não é essa a sensação que todos temos ao entrar numa livraria e escolher um livro? Mais fácil mesmo era comprar a livraria! Mas mesmo que o dinheiro chegasse para tanto, depois iria faltar tempo para pôr a leitura em dia... :D

Beijocas!

ps - escreveste um comentário no meu blogue que não saiu, mas não tive culpa nisso; li-o no mail e respondi à mesma... ;)

Isabel disse...

Os livros são um mundo maravilhoso e um vicío.
Um abraço e bom fim-de-semana

Andreia disse...

Vai um troca de marcadores de livros? Tenho alguns repetidos e posso mandar por mail para ver se queres :p

Beijinhos****

susemad disse...

Nem me digas nada, Teté! Ainda este fim de semana voltei a cair na tentação ao entrar numa livraria...
Já fui lá ler a tua resposta. ;)
Beijocas


Pois são, Isabel! Mas nem todos partilham deste vício! Há até quem considere que o dinheiro é muito mal empregue na compra de livros.
Boa semana!


Olá Andreia!
Não me importo nada de enviar-te alguns marcadores que tenho cá por casa repetidos. ;) Envia-me a tua morada para susemad@gmail.com
Até uma próxima!

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